Pela primeira vez, uma pesquisa conseguiu comprovar que cachorros têm memória de curto e longo prazo — e podem, assim, se lembrar de ação do dono
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- No estudo, os animais foram capazes de imitar tarefas realizadas por seus donos mesmo depois de um intervalo entre observar a ação e reproduzi-la
Os cães domésticos são, por natureza, muito receptivos e atraídos pela comunicação com seres humanos. Eles têm o hábito de observar os donos e humanos em geral, e, por isso, seu aprendizado é influenciado pelas pessoas que o cercam. Em outras palavras isso quer dizer que a vida em um ambiente com o homem pode ter favorecido sua capacidade de aprender com ele.
No estudo, os autores Claudia Fugazza e Adám Miklósi decidiram testar a habilidade cognitiva dos cães e descobrir se eles eram capazes de imitar as ações humanas, mesmo após um determinado intervalo de tempo. O estudo foi feito com oito cachorros domésticos adultos, treinados pelos donos de acordo com um método denominado “Do as I do” (Faça como eu, em tradução livre) — criado por Claudia e que tem como princípio avaliar a capacidade de imitação dos cães.
Os pesquisadores testaram essa capacidade nos animais após intervalos que iam de 40 segundos a 10 minutos, contados a partir do momento em que a ação era mostrada. Durante esse intervalo, os cachorros eram levados a se distrair, se engajando em outras atividades.
Teste — “Valentina, a dona, fez sua cadela Adila ficar parada e prestar atenção nela, sempre na mesma posição inicial. Três objetos foram colocados à frente de Adila, todos à mesma distância, e então Valentina demonstrou uma ação relacionada a um dos objetos, como tocar um sino”, explicou a pesquisadora, descrevendo um dos testes realizados no estudo.
A cadela e sua dona então fizeram uma pausa, durante a qual os objetos foram escondidos por uma tela. No intervalo, Adila brincou com uma bola, treinou outros truques ou ficou livre para passear, farejar a grama e latir para as pessoas que estavam por perto.
Ao final do intervalo, Adila foi colocada novamente na posição inicial e recebeu um comando genérico, para executar a ação que tinha observado antes — sem que fosse dito o nome da ação. “Após o comando, ela realizou a atividade que tinha sido demonstrada antes”, conta Claudia. Os testes mostraram que os cachorros são capazes de reproduzir ações familiares e novas com intervalos diferentes — as primeiras puderam ser repetidas após os maiores intervalos, de até 10 minutos, enquanto atividades novas, após cerca de um minuto.
“A capacidade para codificar e lembrar uma ação após um intervalo demonstra que os cachorros têm uma representação mental da demonstração humana. Além disso, a capacidade de imitar, após um período de tempo, uma ação que não havia sido praticada antes sugere a presença de um tipo específico de memória de longo prazo nos cachorros. Esta poderia ser a memória declarativa, que se refere a conhecimentos e fatos que podem ser relembrados”, escrevem os autores no artigo.
CONHEÇA A PESQUISA
Título original: Deferred imitation and declarative memory in domestic dogs
Onde foi divulgada: periódico Animal Cognition
Quem fez: Claudia Fugazza e Ádám Miklósi
Instituição: Universidade Eötvös Loránd e MTA-ELTE Grupo de Pesquisa de Etologia Comparativa, na Hungria
Dados de amostragem: Oito cachorros domésticos adultos
Resultado: Os pesquisadores mostraram que os cachorros eram capazes de reproduzir atividades após vê-las serem executadas por humanos, mesmo com um intervalo e distrações entre a observação e a execução.
Opinião do especialista
Alexandre RossiZootecnista e especialista em cognição animal
“Essa foi a primeira vez que esse tipo de competência nos cães foi comprovada cientificamente. É como se a ciência estivesse muito atrás do que a gente já sabe como donos de cachorros. Mas ela vai separando o que a gente acha, daquilo que é real. Isso é muito valioso para o mundo acadêmico, e até para entender melhor crenças e percepções dos seres humanos sobre esses animais.
“O que a ciência também já descobriu é que os cães têm muita facilidade em entender os gestos humanos, mais até do que os chimpanzés. Eles têm uma capacidade muito grande de prestar atenção nos seres humanos, o que aumenta sua facilidade em executar tarefas. Essa competência em prestar atenção pode ser decorrente do fato de que o cão é um animal social, que originalmente caçava e se defendia em grupo. Então, ter capacidade de prestar atenção nos membros do grupo era muito importante para sua sobrevivência. Como os cachorros são acostumados com os seres humanos desde pequenos, o homem vira uma espécie de integrante do grupo dele.
“Algumas pessoas acreditam que o cachorro tem memória curta, e isso não é verdade. Certas experiências que ele tem, mesmo sendo uma única vez, podem alterar seu comportamento por toda a vida, como é o caso de traumas muito intensos. Também sabemos que um cachorro pode aprender muitas coisas e, mesmo se o seu dono ficar fora por anos, ele consegue reaprender em questão de minutos quando o dono retorna”.
Fonte: Veja
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